Criado há dois anos para compensar o fim do financiamento empresarial de campanhas políticas, repasses de dinheiro público para as legendas podem chegar a R$ 4,63 bilhões em 2020, valor 25 vezes (ou 2.400%) maior do que os R$ 181,7 milhões distribuídos às siglas há 24 anos. As informações são do jornal Estado de S. Paulo.
O fundo eleitoral pode atingir nas eleições de 2020 uma cifra recorde que supera em R$ 1 bilhão o valor total doado por empresas aos candidatos a prefeito e vereador de todo o País em 2012, último pleito municipal em que a prática foi permitida. O novo aporte proposto no Congresso faz com que os repasses de dinheiro público a partidos políticos no ano que vem sejam 25 vezes maior do que em 1996, após a aprovação da Lei dos Partidos.
Uma alteração feita semana passada na LDO (Lei de Diretrizes Orçamentárias) de 2020 pelo deputado federal Cacá Leão (PP-BA), relator do projeto, autoriza o repasse de até R$ 3,7 bilhões de recursos públicos para as campanhas municipais do ano que vem. A quantia é mais do que o dobro do valor distribuído nas eleições gerais de 2018 (R$ 1,7 bilhão), primeiro ano de vigência do fundo criado após a extinção das doações empresariais – definida pelo STF (Supremo Tribunal Federal) em 2015.
Somada a verba anual do Fundo Partidário, criado em 1995 para custear o funcionamento dos partidos, os repasses de dinheiro público para as legendas podem chegar a R$ 4,63 bilhões em 2020, valor 25 vezes (ou 2.400%) maior do que os R$ 181,7 milhões distribuídos às siglas há 24 anos. Desde então, só o valor do fundo permanente quadruplicou, chegando a R$ 927 milhões neste ano.
Segundo Cacá Leão, o aumento do valor do fundo eleitoral foi solicitado pela “maioria dos partidos” com o argumento de que o montante destinado às eleições de 2018, que contou com 26 mil candidatos, seria insuficiente para financiar as campanhas de prefeitos e vereadores dos mais de 5,5 mil municípios brasileiros no pleito de 2020, do qual devem participar cerca de 500 mil candidatos.
A ideia de turbinar o fundo eleitoral recebeu o apoio do presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), que não considerou o valor de R$ 3,7 bilhões exagerado. “Acho que uma eleição municipal, com 5 mil municípios com milhares de candidatos a vereador, é uma campanha que vai requerer um custo um pouco maior que a eleição do regime geral”, disse Maia, na semana passada.
Segundo os registros do TSE, empresas como bancos, construtoras e mineradoras doaram R$ 2,75 bilhões (em valores corrigidos pela inflação) para cerca de 440 mil campanhas em 2012. O PT, com R$ 414,3 milhões, o então PMDB (R$ 303,3 milhões) e o PSDB (274,5 milhões) lideraram as arrecadações de empresas. Os números mostram que o novo fundo eleitoral proposto repõe todo o financiamento empresarial de 2012, quando foram feitas as campanhas mais caras da história para prefeito e vereador, e ainda gera uma “gordura” de R$ 1 bilhão.
Para analistas, o valor de R$ 3,7 bilhões proposto sugere a inclusão no novo fundo eleitoral dos gastos de campanha não contabilizados e revelados pela Operação Lava-Jato. Só a Odebrecht admitiu em seu acordo de delação premiada ter repassado R$ 46,7 milhões de caixa 2 para campanhas a prefeito de ao menos sete capitais em 2012. Na lista, aparecem as candidaturas do ex-prefeito paulistano Fernando Haddad (PT) e do ex-prefeito carioca Eduardo Paes (ex-PMDB e hoje no DEM). Ambos negam as acusações.
“A mensagem que esses dados sugerem é a de que uma parte das eleições só existia graças aos repasses irregulares, como se os partidos estivessem embutindo nesse R$ 1 bilhão a mais o peso do caixa 2 nas campanhas passadas”, afirma o cientista político Humberto Dantas, pesquisador da Fundação Getúlio Vargas (FGV).
Em Salvador, por exemplo, executivos da Odebrecht afirmaram ter doado legalmente R$ 400 mil para a campanha do prefeito ACM Neto (DEM-BA) e mais R$ 1,8 milhão por fora. Outro caso citado pelos delatores foi a campanha de Luiz Marinho (PT), ex-prefeito de São Bernardo do Campo, que teria recebido R$ 50 mil de forma declarada e R$ 550 mil por meio de caixa 2. Ambos negam as irregularidades.