Quem olha para as 28 estufas espalhadas em uma área de 5,5 hectares não imagina as dificuldades enfrentadas pela família Hochscheidt, de São Sebastião do Caí, até se consolidar como uma das principais produtoras de hortaliças do município. À estrutura para plantio se soma a uma área bem organizada, com bom uso de tecnologia e equipamentos, além de manejos adequados que garantem o cultivo de olerícolas como alface, rúcula, salsa, couve-folha, pepinos salada e japonês, pimentão, tomate cereja, brócolis e couve-flor, entre outras.
Um dos responsáveis pela produção, o jovem Natan, de 32 anos, conta que a comercialização é feita diretamente à Ceasa/RS e por meio de políticas públicas como o Programa Nacional de Alimentação Escolar (Pnae). Motivado, o agricultor relata que o próximo passo da família – que é completada pelo pai Leomar, pela mãe Arceli e pela esposa Julia, além da filha – é investir em uma agroindústria para oferta de produtos minimamente processados, como kits para sopa, aipins descascados e outras verduras higienizadas, picadas e embaladas.
A documentação para a legalização do empreendimento já foi encaminhada, com o apoio da Emater/RS-Ascar. Por meio do Programa Estadual de Agricultura Familiar (Peaf), a agroindústria deve receber o certificado ainda neste primeiro semestre de 2023, estando apta nas esferas sanitária, tributária e ambiental. “Será um passo importante na busca por ampliar mercados, ter contato direto com o consumidor e ofertar um alimento prático e de qualidade”, argumenta o produtor, que garante que o foco será a oferta local.
Natan mostra satisfação, parece preservar o sorriso, especialmente pela família ter conseguido ultrapassar as dificuldades decorrentes da pandemia, que foi justamente o período que fez com que eles “recalculassem a rota”, passando a investir na oferta de kits de alimentos. Mas o semblante do produtor só se modifica quando ele é perguntado sobre o passado dos Hochscheidt, na agricultura. Feita de altos e baixos, a história da família parece daquelas dignas de filmes. “É até difícil de segurar as lágrimas”, argumenta o agricultor.
Natural de Três Passos, a família chegou a São Sebastião do Caí em 1995, onde trabalhou em diversas propriedades até que conseguissem juntar dinheiro para a aquisição das primeiras terras, no final dos anos 90. Após um período como arrendatários, compraram a propriedade onde estão, na localidade de Arroio Bonito, e que mais adiante consolidaria a marca Leomar Hortifruti. “Literalmente aqui era tudo mato, tivemos que remodelar, iniciar do zero, começando pequenos, com poucas mudas, uma vendinha aqui e outra ali”, explica.
Quase sempre no limite de “quebrar”, Natan lembra as dificuldades decorrentes da inexperiência com a gestão, um dos gargalos que fez com que a propriedade tivesse dificuldade de crescer. “O ano era 2009 e lembro a cena do pai vendendo o único carro que tínhamos, um Monza, para poder comprar cinco cargas de esterco para que pudéssemos prosseguir”, comenta. E se já não bastassem todos os entraves para que o negócio deslanchasse, ainda houve um trágico temporal que destruiria tudo naquele ano. “Não tínhamos lavoura, não tínhamos casa, não tínhamos nada”, comove-se o produtor.
Impelido a não desistir, Natan chegou a cogitar ir trabalhar fora, em uma fábrica de calçados. Ao lado da mãe, chegaram a preencher o formulário requisitando emprego. “Mas o caso é que eu não conseguia me imaginar trabalhando fora”, recorda. O agricultor lembra “como se fosse hoje” da cena, reiniciando tudo de novo, por volta de 2010/2011 com algumas poucas estufas de pepino. “Foi necessária muita força de vontade para dar a volta por cima, muita união da família para que não desabássemos totalmente”, se emociona.
Em sua história, Natan diz não ter vergonha em agradecer o apoio de políticas públicas diversas do Estado e do município, bem como da Emater/RS-Ascar e da cooperativa Sicredi, que lhe estenderam a mão nos mais variados momentos. Durante o relato, o olericultor também valoriza o papel do pai no processo, como um guia que sempre deixou as portas abertas para que os filhos, Natan e o irmão Daniel, tomassem decisões e tivessem oportunidades para estudar, crescer, trabalhar. “Foi um sacrifício grande”, pontua.
É nessa hora que o sorriso retorna ao rosto de Natan. Especialmente quando ele pensa que os problemas de hoje envolvem apenas qualificar o manejo, pensar estratégias para a organização da propriedade, se capacitar. “A gente chegou muito perto de passar fome e hoje temos todo esse patrimônio”, comemora. Um patrimônio que deve, se depender do esforço e do trabalho da família, crescer ainda mais. O que garantirá produtos saborosos para os consumidores, uma vez que os produtores seguem boas práticas agrícolas, respeitando ainda o meio ambiente.